Por D. Orani João Tempesta, O. Cist.
Arcebispo do Rio de Janeiro
Iremos celebrar com grande alegria,
na próxima sexta-feira, dia 07 de junho [hoje], a Solenidade do Sagrado Coração
de Jesus. Com esta solenidade a Mãe Igreja, em todo o mundo, é convidada a
fazer a sua jornada mundial de orações pelos sacerdotes.
O culto
litúrgico ao Sagrado Coração de Jesus na sexta-feira seguinte ao Corpus Christi
teve início no século XVII com São João Eudes († 1680) e Santa Margarida
Alacoque († 1690), embora a devoção remonte aos séculos XIII e XIV, recebendo a
primeira aprovação pontifícia um século mais tarde. Em 1856, o papa Pio IX
estendeu a festa a toda a Igreja, e em 1928 Pio XI lhe deu a máxima categoria
litúrgica. A reforma pós-conciliar renovou profundamente seus textos com base
no formulário da missa composto por ordem de Pio XI. Sabemos, porém, que o que
essa devoção nos anuncia vem da revelação: o amor de Deus anunciado a nós por
Jesus Cristo Nosso Senhor, que deu sua vida por todos nós.
Para o
Papa Bento XVI o culto ao Sagrado Coração de Jesus confunde-se com a história
do Cristianismo. Ao compreendermos que o mistério do amor de Deus sobre nós é
conhecido por meio da manifestação deste amor de forma mais profunda na
Encarnação e também na Paixão e morte de Jesus na Cruz. Ensina o Papa Emérito:
“Por outro lado, esse mistério do amor de Deus por nós não constitui só o
conteúdo do culto e da devoção ao Coração de Jesus: é, ao mesmo tempo, o
conteúdo de toda verdadeira espiritualidade e devoção cristã. Portanto, é
importante sublinhar que o fundamento dessa devoção é tão antigo como o próprio
cristianismo. De fato, só se pode ser cristão dirigindo o olhar à Cruz de nosso
Redentor, “a quem transpassaram” (João 19, 37; cf. Zacarias 12, 10)”.
Assim, a
devoção ao Sagrado Coração de Jesus dá-se não só pelo mero cumprimento devocional,
mas como um profundo mergulhar na vivência radical do Evangelho. Inserindo-se
no coração aberto de Jesus, inseri-se na vida de Cristo e na união de vontades,
e tem como fruto uma relação viva entre Deus e o homem. Ensina o Papa
emérito que: “A resposta ao mandamento do amor se faz possível só com a
experiência de que este amor já nos foi dado antes por Deus” (cf. encíclica
«Deus caritas est», 14). O culto do amor que se faz visível no mistério da
Cruz, representado em toda celebração eucarística, constitui, portanto, o
fundamento para que possamos converter-nos em instrumentos nas mãos de Cristo:
só assim podemos ser arautos críveis de seu amor. Esta abertura à vontade de Deus,
contudo, deve renovar-se em todo momento: «O amor nunca se dá por “concluído” e
completado» (cf. encíclica «Deus caritas est», 17).
Acho
oportuno que neste mês de junho, em preparação para a festa do Sagrado Coração
de Jesus, façamos um esforço de conhecer, ler, estudar e meditar a Carta
Encíclica Haurietis Aquas, do Sumo Pontífice Papa Pio XII, sobre o culto
do Sagrado Coração de Jesus.
O Papa
Pio XII ensinou, com propriedade, que, também a Igreja e os sacramentos
são dons do sagrado coração de Jesus. Diz o Papa: "Não se pode, pois,
duvidar de que, participando intimamente da vida do Verbo encarnado, e pelo
mesmo motivo sendo, não menos do que os demais membros da sua natureza humana,
como que instrumento conjunto da Divindade na realização das obras da graça e
da onipotência divina,(28), o Sagrado Coração de Jesus é também símbolo
legítimo daquela imensa caridade que moveu o nosso Salvador a celebrar, com o
derramamento do seu sangue, o seu místico matrimônio com a Igreja: "Sofreu
a paixão por amor à Igreja que Ele devia unir a si como esposa".(29) Portanto,
do coração ferido do Redentor nasceu a Igreja, verdadeira administradora do
sangue da redenção, e do mesmo coração flui abundantemente a graça dos
sacramentos, na qual os filhos da Igreja bebem a vida sobrenatural, como lemos
na sagrada liturgia: "Do coração aberto nasce a Igreja desposada com
Cristo... Tu, que do coração fazes manar a graça".(30) A respeito desse
símbolo, que nem mesmo dos antigos Padres, escritores e eclesiásticos foi desconhecido,
o Doutor comum, fazendo-se eco deles, assim escreve: "Do lado de Cristo
brotou água para lavar e sangue para redimir. “Por isso, o sangue é próprio do
sacramento da Eucaristia; a água, do sacramento do Batismo, o qual, entretanto,
tem força para lavar em virtude do sangue de Cristo".(31) O que aqui se
afirma do lado de Cristo, ferido e aberto pelo soldado, cumpre aplicá-lo ao seu
coração, ao qual, sem dúvida, chegou a lançada desfechada pelo soldado,
precisamente para que constasse de maneira certa a morte de Jesus Cristo. Por
isso, durante o curso dos séculos, a ferida do coração sacratíssimo de Jesus,
morto já para esta vida mortal, tem sido a imagem viva daquele amor espontâneo
com que Deus entregou seu Unigênito pela redenção dos homens, e com o qual Cristo
nos amou a todos tão ardentemente que a Si mesmo se imolou como hóstia cruenta
no Calvário: "Cristo amou-nos e ofereceu-se a Deus em oblação e hóstia de
odor suavíssimo" (Ef 5, 2) “(Cf. Haurietis Aquas, 39).
A Igreja
estima muito a devoção ao Sagrado Coração de Jesus e, particularmente o
Apostolado da Oração nos matricula na escola do Coração de Cristo, porque a
Igreja e todos os batizados são dons do Sagrado Coração de Jesus. A ternura e a
acolhida de Cristo para com todos deve ser o apanágio de nossa devoção ao
Coração de Cristo, que sempre acolheu e nos ensina a acolher e a evangelizar.
Portanto,
prestar culto ao Sagrado Coração de Cristo significa adorar aquele Coração que,
depois de nos ter amado até o fim, foi trespassado por uma lança e do alto da
Cruz derramou sangue e água, fonte inexaurível de vida nova.
A festa
do Sagrado Coração foi também o Dia Mundial pela Santificação dos Sacerdotes,
ocasião propícia para rezar a fim de que os presbíteros nada anteponham ao amor
de Cristo. Que nossos sacerdotes possam, a exemplo do que representa a imagem
do Sagrado Coração de Jesus, lançar a sua mão direita, aberta para o infinito,
convocando todos os que estão à margem para procurarem o Coração de Cristo, que
é a Igreja. E nossas mãos esquerdas, a exemplo da imagem do Sagrado Coração,
sejam sempre dirigidas, com nossos atos, para o Coração de Cristo, que a todos
nós acolhe, ama, perdoa e nos fortaleza na missão de testemunhar o
Ressuscitado!
Levemos o
amor do Coração de Cristo às periferias e que nossas lideranças e clero
promovam uma nova evangelização.
Sagrado
Coração de Jesus, temos confiança em vós!