quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Leitura Orante da Sagrada Escritura

O Concílio Vaticano II, na Constituição Dogmática “Dei Verbum”, quando trata do lugar da Sagrada Escritura na vida da Igreja, “exorta, de maneira insistente e particular, todos os fiéis a que aprendam ‘a eminente ciência de Jesus Cristo’, com a leitura freqüente das divinas Escrituras” (DV, nº 25). E, mais à frente, o texto diz: “Lembrem-se, porém, que a oração deve acompanhar a leitura da Sagrada Escritura, para que haja colóquio entre Deus e o homem; pois com Ele falamos quando rezamos, e a Ele ouvimos quando lemos os divinos Escritos” (cf. Santo Agostinho). Esta Leitura Orante pedida pelo Concílio corresponde ao resgate da oração da tradição da Igreja. Vejamos em que consiste tal prática.

Jesus e a Leitura Orante
            Segundo o Compêndio do Catecismo, pergunta 541, Jesus aprendeu a rezar com sua mãe e com a tradição hebraica. Ora, a oração judaica é marcada pela presença da leitura do texto sagrado: seja da meditação da lei e dos profetas, seja da recitação dos salmos. De fato, na vida de Jesus, narrada pelos evangelhos, vemos como era presente as passagens do Antigo Testamento, e só Ele podia, com autoridade, dizer: “Era preciso que se cumprisse tudo o que foi escrito sobre mim na lei de Moisés, nos profetas e nos salmos” (Lc 24,44-45). Jesus, na sua oração íntima de Filho amado de Deus, discerniu, a partir das Escrituras, o mistério de sua identidade e de sua missão.

A Igreja nascente e a Leitura Orante
            O Novo Testamento foi gerado ao longo da segunda metade do século I. Ele, por si só, já testemunha como, para a Igreja nascente, era importante na sua vida de oração a presença da Sagrada Escritura e a leitura dela a partir de Cristo. A Igreja se unia em oração e meditava as letras sagradas, vendo nelas as promessas de Deus, as suas realizações em Cristo e o seu prolongamento na vida eclesial. O Catecismo da Igreja Católica (CIC), nº 2.624, afirma que “as orações são, sobretudo, as que os fiéis ouvem e lêem nas Escrituras, atualizadas, porém, principalmente, as dos salmos, a partir de sua realização em Cristo”. Realmente, o “livro dos salmos”, dentre os do Antigo Testamento, é o mais citado no Novo, revelando uma comunidade orante.

Os padres e a Leitura Orante
            A Tradição da Igreja vai inspirada na própria Escritura, recolher e propor a leitura orante como Oração da Igreja. É inegável que uma das características da Teologia dos Padres é o contato com a Bíblia. São Jerônimo vai dizer: “como seria possível viver sem o conhecimento das Escrituras, se é por ela que se aprende a conhecer o próprio Cristo, que é a vida dos crentes?”. É abundante na literatura dos padres e doutores comentários aos livros da Sagrada Escritura, comentários formados a partir da oração para alimentar a fé daqueles que os ouviam ou liam seus escritos.

Os passos da Leitura Orante
            O método da leitura orante das Escrituras possui quatro passos fundamentais: a leitura (lectio), a meditação (meditatio); a oração (oratio); e, a contemplação (contemplatio). A leitura é aquele passo no qual perguntamos “o que diz o texto bíblico em si?”. É indispensável buscar conhecer o sentido literal do texto. Em que livro se encontra o texto? Em que parte do livro? Quem escreveu? Em que contexto? Sobre o quê se trata? Quem são os personagens envolvidos? Seus atos e falas? No segundo passo, a meditação, nos perguntamos “o que o texto bíblico diz para nós?”. É Deus que nos fala através do texto e ilumina nossa vida, possibilitando um discernimento sobre ela a luz de Cristo. O terceiro passo é a oração. Somente depois de acolhermos o que Deus nos diz pela Escritura é que nos voltamos para “dizer a Ele o que o texto nos inspira”. Este ato de falar é uma resposta dada a sua palavra e pode se manifestar como um pedido, uma intercessão, uma ação de graças e/ou um louvor. O último passo é a contemplação na qual, no silêncio do coração, somos chamados a olhar a nossa realidade e a do mundo a partir do dom de Deus.

A Leitura Orante e a Liturgia
            A oração por excelência da Igreja, e o lugar privilegiado para a escuta da Palavra de Deus é a Liturgia. Por conseguinte, na liturgia da palavra da Eucaristia e dos outros sacramentos e sacramentais, bem como na Liturgia das Horas, se apresenta a estrutura de escuta e de resposta. Manifesta, assim, o caráter eclesial, pois é o povo de Deus convocado e reunido em assembleia, que recebe uma palavra e é vocacionado à respondê-la. A leitura orante do fiel entra dentro desta moldura maior que é a celebração e a vida da Igreja. Seguindo o ritmo do Ano Litúrgico, com seus diferentes tempos, o cristão entra em comunhão com o mistério pascal de Cristo, presentificando-o e atualizando-o em sua própria vida a partir da celebração litúrgica e do prolongamento dela na sua vida de oração.

Para aprofundar
            Para saber mais sobre o assunto, conferir os parágrafos do Catecismo da Igreja Católica (CIC), nºs 133, 1177, 2653 e 2708; o Compêndio do Catecismo, da pergunta 541 até a 577; o Youcat, a pergunta 502; e, a Constituição Dogmática Dei Verbum, nº 25.

Pe. Vitor Gino Finelon
Professor das Escolas de Fé e Catequese Mater Ecclesiae e Luz e Vida