O Concílio Vaticano II, na Constituição Dogmática “Sacrosanctum
Concilium” nº 10, afirma que “a Liturgia é o cume para o qual se dirige a ação
da Igreja e, ao mesmo tempo, a fonte de onde emana toda sua força”. Assim
sendo, “a Igreja deseja que os fiéis tenham uma participação plena, consciente
e ativa na celebração litúrgica” (cf. LG 14). De fato, a Liturgia, como
espiritualidade da Igreja, conduz os fiéis para uma vivência do mistério pascal
de Cristo, fonte da salvação.
Liturgia
A nossa
palavra ‘liturgia’ vem da palavra grega leitourgia.
Esta, formada por leiton (povo) e ergon (obra, ação), significa um serviço
prestado ao povo ou ao bem comum. Quando a Bíblia hebraica foi traduzida em
Alexandria para o grego, Bíblia dos LXX, a palavra liturgia vai aparecer por
volta de 150 vezes, ligada ao culto que os sacerdotes e levitas ofereciam no
templo (Ex 27,19; 28,35.43; Nm 4,4; 31,33.39; 1Cr 23-28). Desta forma, já no
Antigo Testamento, o termo ‘liturgia’ vai significar uma ação cultual em favor
do povo de Deus.
No texto
do Novo Testamento (NT), a palavra ‘liturgia’ aparece com cinco significados
diferentes, a saber: no sentido grego, como obra pública (Fl 2,17.25.30; Rm
13,6); no sentido do culto do AT (Lc 1,23; Hb 8,2.6); como vivência pública da
religião (Rm 15,26-28; 2Cor 9,12-13); como culto espiritual (Rm 15,16; Fl
2,16); e como culto ritual da comunidade cristã (At 13,2; Hb 8,2-6). O
Catecismo da Igreja Católica (CIC) nos diz, no parágrafo 1070, que no NT, a
Liturgia não só designa o culto, mas também a obra de evangelização e a
caridade em ato. Dessa forma, ela se torna a fonte por excelência da
espiritualidade cristã, pois na medida de Cristo, o único liturgo, os cristãos
prolongam sua vida de glorificação do Pai e de santificação dos homens.
Herdeiros
da espiritualidade da Escritura, os Padres da Igreja vão designar como
‘liturgia’ o culto novo que surge do sacerdócio de Cristo, no qual os homens
são admitidos pela graça do Batismo e encontram seu centro na celebração da
Eucaristia. Outros termos, ao longo da história, foram usados para dar conta
das celebrações cristãs, tais como: ofício, sagrados ritos, celebração, ação
etc.
A
“Sacrosanctum Concilium” nº 7 nos afirma que a Liturgia é o “exercício da
função sacerdotal de Cristo. Nela, os sinais sensíveis significam e, cada um à
sua maneira, realizam a santificação dos homens; nela, o Corpo Místico de Jesus
Cristo – cabeça e membros – presta a Deus o culto público integral.” Nesta
importante definição apresentada pelo Concílio, temos os elementos essenciais
da ação litúrgica.
De fato, a
Liturgia começa com a ascensão de Cristo ao Pai e a entrega de seu Espírito aos
homens para manifestar a Igreja. A ação de graças perene que o Filho tributa ao
Pai na Liturgia celeste é participada, na virtude do Espírito, pela Igreja.
Cristo é o centro do culto, pois é por Ele, com Ele e n’Ele que podemos nos
voltar para o Pai e agradecê-Lo pelo dom sem igual do Espírito, com o qual nos
tornamos seus filhos (cf. Rm 8,15). Assim, o oficio que prestamos aqui é um
sinal daquele prestado no céu e é um caminho que nos guiará até o louvor pleno
e definitivo na casa do Pai.
Por ora, a
vivência litúrgica é sacramental, pois se utiliza de sinais e símbolos para nos
revelar realidades mais profundas. São muitos os sinais presentes nas
celebrações litúrgicas: o pão, o vinho, o ser humano, o templo, a luz, o
incenso, a água, a palavra, o óleo... Todavia, estas realidades apontam para
outras: o pão e vinho que se tornam o corpo e o sangue do Senhor, por exemplo.
Estes sinais servem para comunicar aos homens a graça da santidade. Por meio de
sinais visíveis se reconhece a ação invisível de Deus. A liturgia da Igreja
pretende ser, por sua união com Cristo, sua grande ação de graças ao Pai, reconhecendo
n’Ele a fonte de todo o bem e de toda a santidade.
As três dimensões da ação litúrgica
Toda ação
litúrgica é, essencialmente, anmenética, epiclética e doxológica. A dimensão
anmenética é aquela do memorial, na qual nós nos recordamos das maravilhas
operadas por Deus na história da salvação, sobretudo do mistério pascal de
Cristo. O próprio Senhor nos mandou fazer memória de sua entrega na cruz (cf.
Lc 22,19; 1Cor 11,25). A dimensão epiclética é aquela invocatória, onde o
Espírito Santo se faz presente para atualizar no hoje aquilo que recordamos sob
seu poder. Jesus nos disse que o Espirito Santo viria para nos recordar e nos
ensinar todas as coisas (cf. Jo 16,13-15). A dimensão doxológica é aquela da
glorificação que fazemos de Deus por sermos alcançados pela sua salvação. A
meta da vida cristã é reconhecer o amor e a misericórdia que nos vêm de Deus
(cf. 2Cor 9,15; Ef 1,12).
Para Aprofundar...
Indicamos
a leitura da Constituição Dogmática “Sacrosanctum Concilium”, capítulo
primeiro; do Catecismo da Igreja Católica (CIC), números 1066 – 1134; do
Compêndio do Catecismo, da pergunta 218 até a 223; e, do Youcat, perguntas de
166 até 178.
Pe. Vitor Gino Finelon
Professor das Escolas de Fé e
Catequese Mater Ecclesiae e Luz e Vida