Segundo o Compêndio do Catecismo, na pergunta 581, a oração do Pai Nosso é
a oração da Igreja por excelência. Jesus a ensinou aos seus discípulos como nos
atestam os relatos de Mt 6,9-13 e Lc 11,2-4. A comunidade cristã, desde o primeiro
século, tem a prática de rezá-la três vezes ao dia, como nos mostra a Didaqué
8,3. Tertuliano, no terceiro século, vai dizer, em seu escrito Sobre a Oração,
que ela é “o resumo do Evangelho” e Santo Tomás de Aquino, na Suma Teológica,
vai chamá-la de “a mais perfeita das orações”. Vejamos agora um pouco da
história e do conteúdo desta oração.
O texto nos Evangelhos
A Sagrada
Escritura apresenta duas versões para a oração do Pai Nosso. São Mateus
apresenta a oração do Senhor dentro do Sermão da Montanha (Mt 5,7). Na intenção
do evangelista fica claro que aquela oração é a dos discípulos de Jesus. São
Lucas oferece a oração dentro de outro contexto, a partir de um pedido de um
discípulo que queria aprender a rezar como o Senhor. Outra diferença entre os
dois relatos reside no número de pedidos: em Mateus aparecem sete e em Lucas,
cinco (omitindo o terceiro e o sétimo). De forma geral, os exegetas afirmam que
Mateus apresenta a forma original da oração e que Lucas apresenta o contexto
original no qual ela foi ensinada.
A oração do Senhor na Tradição
Como
afirmamos acima, a Didaqué nos permite conhecer que a versão de Mateus, com
sete pedidos, era rezada na liturgia das comunidades cristãs no final do
primeiro século. Os Padres da Igreja, por conta da presença da oração dominical
na liturgia, teceram muitos comentários sobre ela. Podemos citar os seguintes
autores cristãos que tentaram compreender tal oração: Tertuliano, Orígenes,
Cipriano e Cassiano. Outros se dedicaram a expor a doutrina do Pai Nosso ligado
com a fé dos catecúmenos, em preparação para os sacramentos de iniciação:
Teodoro de Mopsuéstia, Agostinho de Hipona, Pedro Crisólogo; Cesário de Arles,
Cirilo de Jerusalém e Ambrósio de Milão. Alguns autores deixaram homilias sobre
a referida oração: Gregório de Nissa, Máximo Confessor, João Crisóstomo e
Jerônimo. A quantidade de autores que se dedicaram a comentar a oração que
Jesus nos deixou revela a sua importância para a Igreja dos padres.
O texto da Oração
Algumas
pessoas ficam em dúvida em relação ao texto do Pai Nosso que rezamos na
liturgia da Igreja, por lhes parecer diferente do texto bíblico. Alguns pontos
podem iluminar tal situação. Primeiramente, como afirmado acima, desde o
primeiro século a Igreja entendeu que a fórmula de Mateus, com sete pedidos,
era mais coerente. Em segundo lugar, o texto em português é uma tradução da
versão latina que, por sua vez, encontra sua base no texto bíblico grego.
Embora no texto grego se use a segunda pessoa do singular (tu), na tradução se
utilizou a segunda pessoa do plural (vós) para se destacar o respeito e a
veneração para com Deus, pois na nossa língua isto é possível. Em terceiro
lugar está a questão da quinta petição. Nesta, usa-se a versão de São Lucas,
pois se entende que a expressão ‘as ofensas’ engloba ‘as dívidas’ (termo usado
por São Mateus). Por conseguinte, o que a tradição entendeu desta parte é que
Deus perdoa os pecados dos homens na medida em que estes se abrem para perdoar
também.
A invocação: Pai Nosso que estais
nos Céus
O
Catecismo da Igreja Católica nos afirma três realidades quando, na oração,
chamamos Deus de Pai. A primeira é que Ele se revelou a nós como Pai por meio
de seu Filho Jesus. Por isso, chamá-lo de Pai é um dom de seu amor para
conosco, pois nunca poderíamos entrar nesta dinâmica relacional se Ele não nos
convidasse.
A segunda
é que nós nos tornamos filhos adotivos pela obra de redenção de Jesus e de
santificação do Espírito. De fato, o Filho único de Deus, Jesus Cristo, nos fez
filhos adotivos pela força de seu Espírito. Santo Agostinho nos diz: “Na oração
do Senhor dizemos todos em conjunto ‘Pai Nosso’. Dizem o mesmo o imperador, o
pedinte, o escravo, o senhor. São todos irmãos, pois têm o mesmo Pai”.
A terceira
é que Deus, revelando-se como Pai e Filho, revela também quem nós somos. Assim,
sabendo que participamos da filiação divina, cresce em nós o desejo e a vontade
de correspondermos com a altura de nossa vocação, e converte-se o nosso coração
à semelhança dos pequeninos e dos humildes. São Gregório Nazianzeno aconselha:
“Devíamos mais frequentemente lembrar-nos de Deus do que respirar”.
O termo
‘nosso’ indica dois aspectos. O primeiro é a fórmula da nova e eterna aliança
selada por Cristo: nós nos tornamos seu povo e Ele, nosso Deus. O segundo é a
eclesialidade desta oração. Cada batizado quando reza, o faz por si e por todos
os outros. É a comunhão dos santos que ele expressa quando reza sozinho ou em
comunidade a oração dominical. Esta oração rompe até as divisões entre os
cristãos, pois todos se reúnem para chamar Deus Pai de ‘nosso’, reconhecendo
uma pertença à grei dos batizados, daqueles que se tornaram filhos no Filho. O
Papa Bento XVI afirma: “O cristão não diz ‘meu Pai’, mas Pai Nosso, até no
segredo do quarto fechado, porque sabe que, em cada lugar, em cada
circunstância, ele é membro de um mesmo Corpo”.
O termo
‘céus’ indica que Deus está acima de todas as coisas que podemos perceber. Ele
não é um lugar, mas um estado de beatitude e de felicidade que esperamos
atingir quando fizermos nossa Páscoa.
Para aprofundar...
Para saber
mais sobre o assunto, indicamos CIC (Catecismo da Igreja Católica), números
2.759 até 2.802; no Compêndio do Catecismo, da pergunta 578 à 586; e no Youcat,
perguntas de 511 até 518.
Pe. Vitor Gino Finelon
Professor das Escolas de Fé e
Catequese Mater Ecclesiae e Luz e Vida