Por D. Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro
Foi
realizada em Roma, junto ao túmulo do Apóstolo São Pedro, a peregrinação
internacional da família dentro do Ano da Fé. Esse evento, que reuniu 150 mil
famílias, coincidiu com o encerramento da 21ª Assembleia Plenária do Pontifício
Conselho da Família. Constaram deste evento três jornadas dedicadas ao estudo e
ao debate, no 30ª aniversário da Carta dos Direitos da Família, publicada pelo
mesmo dicastério vaticano em 22 de outubro de 1983, sob o Pontificado do Beato
João Paulo II. O encontro, aberto ao público, debateu os “Novos horizontes
antropológicos e os direitos da família”.
Declarou o
Arcebispo Dom Vincenzo Paglia, presidente do Conselho Pontifício para a
Família, em entrevista à Rádio Vaticano, que esta Carta dos Direitos da Família
é defendida e valorizada como meio “para que não nos esqueçamos que a família,
como sujeito jurídico, é uma dimensão que transpassa os séculos, que não nasceu
anteontem nem há cem anos. Há uma dimensão que atravessa a história, que fez da
família o primeiro lugar em que aprendemos a estar juntos: a família é o
primeiro ‘nós’”.
A família
foi querida por Deus desde que o Criador concebeu Adão e lhe deu Eva como
esposa, determinando que habitassem a terra e se perpetuassem pelo seu amor
esponsal. Sabemos como a instituição familiar tem sido atacada por todos os
lados: instituições internacionais, legislações ideológicas, decretos do
executivo, julgamentos nos tribunais, propaganda sistemática na mídia – por
todos os lados há muito mais facilidade de alguém se colocar contra a família
do que construir os valores positivos e essenciais da família humana. São
tempos difíceis para a família e é muito importante que, ao valorizarmos a
família, saibamos da campanha contrária a ela em tantos âmbitos de nossa
sociedade. Como cidadãos temos o direito de dar nossas opiniões e manifestar
nossas convicções, que são importantes para o futuro da humanidade.
Assim o
Papa conclamou os jovens voluntários, no seu encontro no Riocentro durante a
JMJ Rio2013: “Deus chama para escolhas definitivas, Ele tem um projeto para
cada um: descobri-lo, responder à própria vocação é caminhar para a realização
feliz de si mesmo. A todos Deus chama à santidade, a viver a sua vida, mas tem
um caminho para cada um. Alguns são chamados a se santificar constituindo uma
família através do sacramento do Matrimônio. Há quem diga que hoje o casamento
está ‘fora de moda’. Está fora de moda? (...) Na cultura do provisório, do
relativo, muitos pregam que o importante é ‘curtir’ o momento, que não vale a
pena comprometer-se por toda a vida, fazer escolhas definitivas, ‘para sempre’,
uma vez que não se sabe o que reserva o amanhã. Em vista disso, eu peço que
vocês sejam revolucionários, eu peço que vocês vão contra a corrente. Sim,
nisto peço que se rebelem: que se rebelem contra esta cultura do provisório
que, no fundo, crê que vocês não são capazes de assumir responsabilidades, crê
que vocês não são capazes de amar de verdade. Eu tenho confiança em vocês,
jovens, e rezo por vocês. Tenham a coragem de ‘ir contra a corrente’. E tenham
também a coragem de ser felizes!”.
O
Documento de Aparecida nos fala desta importância de valorizar a família e de
tutelar os seus direitos neste tempo de mudança de época: a família não é mera
instituição natural; antes, faz parte do projeto do Criador (cf. Gn 1,27), de
modo que “pertence à natureza humana que o homem e a mulher busquem um no outro
sua reciprocidade e complementaridade” (nº 116). Na plenitude dos tempos, o
Filho de Deus assumiu a nossa natureza humana e, “optando por viver em família
em meio a nós, a eleva à dignidade de ‘Igreja doméstica’ ” (nº 115). O amor
conjugal “é assumido no Sacramento do Matrimônio para significar a união de
Cristo com sua Igreja” (nº 117; cf. 175g; 433s). É na família que a pessoa
“descobre os motivos e o caminho para pertencer à família de Deus” (nº 118).
O Beato
João Paulo II, na Carta às Famílias de 1994, ensinou que: “Entre essas
numerosas estradas, a primeira e a mais importante é a família: uma via
comum, mesmo se permanece particular, única e irrepetível, como irrepetível é
cada homem; uma via da qual o ser humano não pode separar-se”. Com efeito,
normalmente ele vem ao mundo no seio de uma família, podendo-se dizer que a ela
deve o próprio fato de existir como homem. Quando falta a família logo à chegada
da pessoa ao mundo, acaba por criar-se uma inquietante e dolorosa carência que
pesará depois sobre toda a vida. A Igreja une-se com afetuosa solicitude a
quantos vivem tais situações, porque está bem ciente do papel fundamental que a
família é chamada a desempenhar. Ela sabe, ainda, que normalmente o homem
sai da família para realizar, por sua vez, num novo núcleo familiar, a própria
vocação de vida. Mesmo quando opta por ficar sozinho, a família permanece, por
assim dizer, o seu horizonte existencial, como aquela comunidade fundamental
onde se radica toda a rede das suas relações sociais, desde as mais imediatas e
próximas até as mais distantes. Porventura não usamos a expressão ‘família
humana’, para nos referirmos ao conjunto dos homens que vivem no mundo? (cf. nº
2).
A Igreja
protege a família, célula sacramental que nasce do amor de um homem e de uma
mulher, em caráter indissolúvel, aberto à vida, promovendo três colunas vitais
como direito inalienáveis: primeiramente, a dignidade da pessoa humana; em
segundo lugar, o sacramento do matrimônio; e em terceiro a
inviolabilidade da vida e da família. Assim como os dogmas estão para
a fé católica, estes três pilares estão para a prática cristã dos batizados na
Igreja Católica, que não devem se cansar de defender os direitos da família
constituída pelo amor verdadeiro e eterno.
Desde
sempre, o lar formado por Jesus, Maria e José é considerado como escola de
amor, oração e trabalho. Da mesma maneira, contemplando a família sagrada,
somos chamados a mostrar ao mundo o amor, o trabalho e o serviço vividos diante
de Deus, tal como os viveu a Sagrada Família de Nazaré. As condições de vida
mudaram muito, e progrediram enormemente nos âmbitos técnicos, sociais e
culturais. Não podemos nos contentar com estes progressos. Juntamente com eles,
devem estar sempre presentes os progressos morais, como a atenção, a tutela e a
ajuda à família, porque o amor generoso e indissolúvel de um homem e de uma
mulher constitui o âmbito eficaz e o fundamento da vida humana na sua gestação,
na sua iluminação, no seu crescimento e no seu termo natural.
A família
nunca cairá de moda: só onde existem o amor e a fidelidade, nasce e perdura a
verdadeira liberdade. Por isso, a Igreja luta por adequadas medidas econômicas
e sociais, para que no lar e no trabalho a mulher encontre a sua plena
realização; a fim de que o homem e a mulher que contraem matrimônio e formam
uma família sejam decididamente apoiados pelo Estado; para que se defenda a
vida dos filhos como sagrada e inviolável, desde o momento da sua concepção; a
fim de que a natalidade seja dignificada, valorizada e apoiada jurídica, social
e legislativamente. Por isso, a Igreja opõe-se a todas as formas de negação da
vida humana e sustenta aquilo que promove a ordem natural no âmbito da
instituição familiar.
Ensina o
Concílio Ecumênico Vaticano II que: “Os próprios esposos, feitos à imagem de
Deus e estabelecidos numa ordem verdadeiramente pessoal, estejam unidos em
comunhão de afeto e de pensamento e com mútua santidade, de modo que, seguindo
a Cristo, princípio da vida, se tornem, pela fidelidade do seu amor, através
das alegrias e sacrifícios da sua vocação, testemunhas daquele mistério de amor
que Deus revelou ao mundo com a sua morte e ressurreição” (GS, 52).
O
Documento de Aparecida nos ensina que a família deve-se tornar “um dos
eixos transversais de toda ação evangelizadora da Igreja” (nº 435) – e neste
âmbito a infância se torna destinatária de uma ação prioritária da Igreja (nº
438). Por isso a Pastoral Familiar – em suas mais variadas expressões
– há de “comprometer de maneira integral e orgânica as outras pastorais, os
movimentos e associações matrimoniais e familiares a favor das famílias” (nº
437a). A principal bandeira para valorizar a família é promover a formação e
ação de leigos competentes, animá-los a se organizarem para defender a vida e a
família, e estimulá-los a participar em organismos nacionais e internacionais.
Que a Sagrada Família proteja as nossas famílias e que seus direitos sejam
respeitados para o próprio bem do futuro da humanidade!