Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro
“Exulte o justo, porque se aproxima da
vitória; rejubile o pecador, porque lhe é oferecido o perdão; reanime-se o
pagão, porque é chamado à vida” (São Leão Magno).
Vitória. Perdão. Vida. Tudo isso nos é dado
porque “o Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos sua glória, a glória
que o Filho único recebe do seu Pai, cheio de graça e de verdade” (Jo 1,14). No
dia 25 de março, a Igreja celebra a anunciação do Senhor e a encarnação do
Verbo; nove meses depois, no dia 25 de dezembro, o Verbo encarnado nasce para
que possamos ver a sua glória velada, mas real. O Menino frágil e dependente de
Maria e de José é o Filho de Deus encarnado, é Ele e somente Ele quem pode
dar-nos a vitória, o perdão e a vida.
Mas podemos recomeçar! O perdão de Deus se
nos oferece constantemente para que, com alegria, vivamos a nossa fé. Por mais
pecador que sejamos não tenhamos medo do Senhor; Ele fez-Se tão pequeno para
que os pequenos deste mundo se aproximassem d’Ele com a esperança da
reconciliação com Deus e com todos os homens. Nem permitiremos que alguma falta
de perdão aos outros invada o nosso coração neste dia santo. Abriremos de par
em par o nosso ser a Deus e a todos os homens e mulheres, máxime àqueles que
estão próximos a nós. Tais pessoas merecem a nossa atenção, gratidão e estima.
Lembremo-nos da oração que o Senhor nos ensinou: “perdoai-nos as nossas ofensas
assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”. Perdoemos! Perdoemos de
coração a quem nos ofendeu e sentiremos um grande alívio, uma grande paz, uma
restauração que vai do mais profundo ao mais periférico do nosso ser.
Tudo foi feito por Ele, e sem Ele nada foi
feito. N’Ele havia vida, e a vida era a luz dos homens. A luz resplandece nas
trevas, e as trevas não a compreenderam” (Jo 1,5). A vida do Filho de Deus
ilumina a vida dos filhos dos homens. Ilumina-a porque a retira das trevas do
pecado e da morte. Ilumina-a porque dá sentido ao que antes estava
desorientado. Ilumina-a porque dá todos os meios necessários para alcançar a
felicidade já neste mundo e, depois, na eternidade. Talvez muitas pessoas
considerem-se como que “jogadas aí na existência” e aí deixadas simplesmente
porque não descobriram o projeto de Deus para as suas vidas. É misterioso e, ao
mesmo tempo, é duro pensar que nós, seres humanos, podemos frustrar os
desígnios de Deus. Foi exatamente isso que aconteceu com alguns dos
contemporâneos de Jesus, fariseus e mestres da Lei, dos quais se diz que ao
rejeitarem o Batismo de João e, posteriormente, o de Jesus “tornaram inútil
para si mesmos o projeto de Deus” (Lc 7,30).
Eis a graça, a glória, o mistério desta noite!
Por isso a alegria: o Deus fiel cumpriu o que prometera e ultrapassou toda
promessa. Nesta noite tão santa, tão única, tão cheia de frescor, como são
comoventes as palavras do apóstolo na segunda leitura. Olhem o presépio e
escutem, olhem a manjedoura e prestem atenção: “A graça de Deus se
manifestou trazendo salvação para todos os homens. Ela nos ensina a abandonar a
impiedade e as paixões mundanas e a viver neste mundo com equilíbrio, justiça e
piedade”. Olhem o presépio! Olhem o presépio: a graça de Deus é uma
Criança, o Menino que nos foi dado! A graça de Deus está “envolvida em
faixas e deitada numa manjedoura”. Que graça pequeninha; que graça tão grande!
Que graça tão frágil; que graça tão forte! Quem é tão duro de coração, que não
se comova? Quem é tão desumano, que não se emocione? Quem é tão pecador, que
não queira aproximar-se de Deus? Quem é tão insensível, que não sinta, nesta
noite, o desejo de amar, o desejo de ser bom, o desejo de paz, o desejo de se
deixar abraçar por Deus? “Não tenhas medo!” Quem quer que sejas tu:
não temas! Não tenhas receio pelos teus pecados, não te afastes da graça desta
noite por causa das tuas infidelidades! Compreende: hoje, teu Deus vem a ti!
Vem a ti a Paz, vem a ti o Perdão, vem a ti a misericórdia, vem a ti a plenitude
do teu coração e o sonho da tua vida! Hoje nasceu para ti, para nós, um
Salvador!
Não tornaremos inútil o projeto de Deus para
nós. Ao participarmos das celebrações da Igreja durante esses dias solenes,
aproximar-nos-emos do presépio humilde de Belém e diremos ao Senhor que a sua
vida encha a nossa vida, que o nosso amor encha o nosso coração e que nas
nossas vidas se cumpram os eternos desígnios da Santíssima Trindade. Maria, a
Mãe de Jesus, está segurando o Menino Jesus nos seus braços e quer deixar que
também nós tenhamos em nossos braços o divino Salvador. Ela sabe que só Ele tem
a chave para todos os mistérios da nossa vida. Jesus, sendo verdadeiro Deus, é
também o verdadeiro homem que mostra em si mesmo como deve ser a pessoa humana
segundo os projetos eternos. Feliz Natal para todos e que o Menino Deus ilumine
nossos caminhos!