segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Aconselhar indecisos e ensinar ignorantes

Pe. Vitor Gino Finelon
Professor das Escolas de Fé e Catequese Mater Ecclesiae e Luz e Vida

No mês de agosto, a Arquidiocese do Rio de Janeiro, em obediência ao pedido feito pelo Papa Francisco, no parágrafo 15 da bula “Misericordiae Vultus”, medita sobre as seguintes obras de misericórdia espirituais: aconselhar os indecisos e ensinar os ignorantes. Essas duas apontam para a missão didático-profética da Igreja e dos cristãos diante de um mundo anestesiado para a realidade e as feridas do erro e do pecado. Neste sentido, podemos nos pôr estas questões: “ser-nos-á perguntado se ajudamos a tirar da dúvida, que faz cair no medo e muitas vezes é fonte de solidão; se fomos capazes de vencer a ignorância em que vivem milhões de pessoas, sobretudo as crianças desprovidas da ajuda necessária para se resgatarem da pobreza” (MV 15).

Aconselhar e ensinar
Na experiência de condução dos homens à comunhão com Deus, a Igreja percebeu a necessidade de atuar em duas importantes frentes. Na primeira, contribuindo para que as pessoas possam discernir seus caminhos à luz da mensagem cristã. Na segunda, formando as consciências para uma crescente adesão à mensagem da salvação. De fato, aconselhar e ensinar são ações em prol do amadurecimento humano-espiritual. Como obras de misericórdia espiritual, nos levam ao acompanhamento do próximo, a fim de que este se desenvolva sob o signo do amor e da compaixão.


Cristo, o Mestre da humanidade
Tanto no primeiro como no Novo Testamento, os crentes reconheceram que Deus sempre ensina o seu povo. Se na Antiga Aliança Ele educava os israelitas por meio dos patriarcas, dos sacerdotes, dos profetas e dos sábios, na Nova Aliança, Jesus – o Deus conosco – é o grande Mestre da humanidade. O Senhor, em seu ministério, proclamou inúmeros discursos, aconselhou diversas pessoas e, por isso, mesmo sem ser escriba, recebeu do povo o título de “Rabi”: “Vós me chamais Mestre e Senhor e dizeis bem, pois eu sou” (Jo 13,13). Todavia, seu ensinamento não é igual ao dos fariseus e dos mestres da Lei, mas é cheio de autoridade, “porque Ele as ensinava com autoridade e não como os escribas e fariseus” (Mt 7,29). A grande novidade de seu ensino é que Ele mesmo escuta, aprende e realiza toda a vontade do Pai: “Eu digo ao mundo o que d’Ele ouvi” (Jo 8,26).

Os dois grandes erros
Em Mt 23,1-12, encontramos uma passagem que trata sobre o modo como a Igreja deve exercer sua tarefa de ensino. O Senhor, sabendo que sua comunidade exerceria um múnus docente diante do mundo, a admoesta para que não viesse a cometer dois erros gravíssimos. O primeiro é a hipocrisia: “eles dizem, mas não fazem” (Mt 23,3). Os discípulos não podem apresentar esta duplicidade, na qual o Mestre não se esforça em nada para encarnar a mensagem dita. O segundo é a vaidade: “gostam de que os homens lhe chamem de rabi” (Mt 23,7). Os seus seguidores devem trazer a marca da simplicidade e do desejo de ajudar o próximo. Para curar desde a raiz o coração dos que iam continuar seu ministério de ensino no mundo, Jesus afirma: “O maior dentre vós será aquele que vos serve. Aquele que se exaltar será humilhado, e aquele que se humilhar será exaltado” (Mt 23,11-12). Desta forma, ensinar e aconselhar alguém não é uma tarefa para hipocrisia e vaidade. Ambas requerem um coração de serviço e de humildade.

A missão da Igreja
O Ressuscitado deixou, por um lado, um mandato aos seus apóstolos – “Ide e ensinai-as a observar tudo quanto vos ordenei” (Mt 28,19) – e, por outro, o dom do Espírito Santo para balizar tal tarefa – “Ele vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que vos disse” (Jo 14,26). Assim, a Igreja ensina o conteúdo salvífico com a autoridade de Cristo. Nesta missão, o ministério ordenado tem um encargo particular: “Os bispos, com os presbíteros seus cooperadores, têm como primeiro dever anunciar o Evangelho de Deus a todos os homens, conforme a ordem do Senhor. Eles são os arautos da fé, que trazem a Cristo novos discípulos, e os doutores autênticos da fé apostólica, munidos da autoridade de Cristo” (CIC 888). Mas, todos os fiéis, também, participam do múnus profético de Jesus: “Cristo realiza a sua missão profética não só através da hierarquia, mas também por meio dos leigos. Para isso os constituiu testemunhas, e lhes concedeu o sentido da fé e a graça da Palavra: ensinar alguém, para o trazer à fé, é dever de todo o pregador e, mesmo, de todo o crente” (CIC 904). Desta forma, até o retorno de Jesus Cristo, a comunidade eclesial deve exercer o encargo de educar e de aconselhar os homens.

O ministério da Palavra
Com o mandato de Cristo e o auxílio do Espírito Santo, a comunidade eclesial é vocacionada a anunciar a mensagem de salvação. Para isso, se utiliza de vários espaços formativos e de diferentes formas de atuação: desde o primeiro anúncio feito aos não batizados, passando pelo aprofundamento do conteúdo da fé na catequese catecumenal e na permanente, chegando ao discurso técnico da ciência teológica e culminando com a palavra proclamada e atualizada na homilia. Outra importante tarefa eclesial ligada à tarefa de aconselhar as pessoas é a da direção espiritual. Nela, a pessoa se coloca diante de seu diretor com o intuito de discernirem a atuação do Espírito Santo, que guia e configura os fiéis, cada vez mais, ao Cristo. Esta prática está cada vez mais franqueada aos fiéis, a fim de que possam responder aos apelos divinos e perseverarem no caminho da salvação. Desta forma, através de todas estas frentes, a Igreja exerce sua tarefa didático-profética, conduzindo todas as gentes ao encontro com o Ressuscitado.

Fonte: http://arqrio.org/formacao/detalhes/1357/aconselhar-indecisos-e-ensinar-ignorantes